Retrato

A destroçada Nova Alta Paulista de Geraldo Alckmin “et al.”!

A região da Nova Alta Paulista agoniza, sem representação política e sem ações estratégicas para seu desenvolvimento.

Por: Isabel Gonçalves
Mapa: A Evangelização da Alta Paulista (Fonte: Diocese de Marília). Mapa: A Evangelização da Alta Paulista (Fonte: Diocese de Marília).

Vivi tanto tempo longe do interior de São Paulo, que não sei se esqueci de como eram as coisas ou se elas degringolaram de uma forma devastadora, mas o choque foi tão grande e forte que fez desmoronar a minha pretensa arrogância paulista, quando confrontada com a realidade. Vejo por estas bandas os mesmos desmando oligárquicos e impunes que, abismada, presenciei pelas entranhas do interior do meu país. Desmandos que pensei restritos apenas aos rincões, longe demais das capitais, localizados nos confins do Brasil, ou nas grandes cidades do norte e nordeste já habituadas a capitular nas mãos de senhores de “engenho”. Mas por estas bandas, oeste do estado de São Paulo, não faltam prefeito cassado, prefeito sendo investigado, prefeito inelegíveis prefeito governando graças a liminares, e a mesma “lógica” se aplica para vereadores, secretários – coisas que nosso preconceito nos faz acreditar que apenas existem nos rincões desse nosso país.

Mas enfim, pensei um pouquinho cá com meus botões, e conclui, “poxa vida, um estado há 20 anos governado pelo mesmo partido não é também uma oligarquia coronelista”? Ora bolas, os moradores do estado mais rico da federação não podem simplesmente não refletir sobre os 20 anos de um mesmo partido que domina suas paragens. Como andará a educação do estado? Mas chegando um pouco mais perto, após 20 anos de PSDB no governo do estado o que restou do oeste paulista? Do interior, desbravado pelos bandeirantes, oeste paulista, outrora um centro de promessas de “progresso”. Hoje, nada mais é do que o tal do corredor da fome, encravado nas ricas terras paulistas, no estado mais poderoso da nação. Cidades pequenas assoladas pela incompetência administrativa e total falta de inteligência gestora, cidades sem planejamento em curto prazo, o que dirá em médio e longo prazo.

Eu fiquei estarrecida, ao conhecer um pouco mais de perto a realidade do estado e do interior empobrecido, principalmente no que tange questões socioambientais e socioeconômicas. E nem estou me referindo ao gravíssimo problema da água que viveu o São Paulo, mas sim da gestão socioambiental e socioeconômica de regiões do interior de São Paulo.

Posso afirmar, sem medo de errar, que a nova alta paulista está abandonada, talvez porque não tenha força política, afinal são apenas dois milhões de eleitores em um universo de aproximadamente 40 milhões, o que representará para os políticos do estado 5% de votos?

Não vejo nenhuma contrapartida ou ações que realmente visem o “ressurgimento” da região, muito menos ações voltadas para a sociedade. Não há gestão inteligente no campo, não há visão estratégica de modernização e aperfeiçoamento da malha de transporte. Cortando todo o estado havia, há 3o anos, um malha ferroviária robusta que foi destruída por estes governantes incompetentes e corruptos que cederam a lobbies criminosos.

Que futuro há para o interior quando a mais econômica e segura forma de transporte de carga e humana foi destruída para dar suporte a conluios? E o que estava por trás disso? Um sistema de corrupção, de beneficiamento de uma parcela de empreiteiras construtoras de estradas, de consórcio de pedágios, montadoras de carros. Destruíram todo um canal de acesso que dava suporte ao interior, empobrecem toda uma região, para beneficiar pagadores de campanhas, e o cenário é muito mais desastroso porque a população sequer se dá conta disso.

Nós, pobres mortais, que pagamos por esta bandalheira toda, não damos contexto a esta realidade. Infelizmente, este padrão de gestão de transporte, passou a ser padrão em nosso país, mesmo governado por outras bandeiras. Taí a Lava Jato, que colocou partidos políticos, a Odebrecht e grande parte das empreiteiras que operam no Brasil em apuros. A Lava a Jato didaticamente nos mostrou, com clareza, como se deu/dá a corrupta parceria entre público e o privado em nosso país.

Com a privatização da malha ferroviária o oeste paulista definhou. Não é coincidência que nossa região desmoronou juntamente com obstrução dessa artéria que nos ligava aos diversos “órgãos” e ao “cérebro" do estado. A Alta Paulista por falta de irrigação entrou em necrose.

Mas estes senhores contaram com a anuência, ignorância, inoperância, até mesmo ingenuidade e principalmente, com a falta de visão em médio e longo prazo de prefeitos e políticos da região. Este cenário é ainda mais assustador porque não há em nossa região força política para reverter este quadro.

É explicita a incapacidade de grande parte dos gestores de nossa região de planejar projetos conjuntos que visem o desenvolvimento da nova Alta Paulista em médio e longo prazo. Não há movimentação efetiva para criar, em conjunto, estratégias que sejam traçadas entre as cidades da região, para lutar por mais investimentos, pergunto: há competência gestora para tanto? Muitos políticos estão imersos em politicagem, muitos deles não são talhados para o cargo. Infelizmente nossos gestores se contentam com migalhas do governo estadual, de senadores e deputados, ou em apenas governar para os “seus” e alguns grupos dominantes. Responsabilidade social passa longe! Transformamo-nos na terra do salário mínimo, de ofertas de serviço de segunda que pagam salários de terceira.

O que restou para o oeste empobrecido do estado de São Paulo? Cana e presídios, uma região que já foi pujante, hoje amarga um declínio absurdo. O oeste paulista sofre com as agruras do clima, da péssima estratégia de gestão do campo, da desindustrialização, da incapacidade de seus gestores, da politicagem e de uma total ausência de estratégia conjunta entre as cidades da região para lutar por mais investimentos.

Afinal, quando você pensa em São Paulo vem em sua mente algum tipo de avanço, mas não, vivemos um ocaso do pensar complexo e do conhecimento. Em Adamantina há um parque, que está simplesmente afundando, pois houve corrosão das tubulações, há um lixão a céu aberto, na realidade 2, uma estação de reciclagem de lixo que mais parece uma câmara de horrores, não há coleta seletiva – sinto muito, o que é feito nem de longe pode ser considerado coleta seletiva -, e a cidade perdeu o selo de município verde e azul, mas convenhamos, apenas pela gestão de resíduos, não merecia este selo há muito tempo. A questão que fica é? Como Adamantina conseguiu manter este selo nos últimos anos, com uns dos lixões da cidade entrando em combustão espontânea, um dia sim e o outro também? Ou com as condições de trabalho dos catadores de lixo na Usina de Reciclagem? O com o lixão a céi aberto sendo “carinhosamente” chamado de aterro por nossas autoridades? Você se sente seguro e representado pelos órgãos responsáveis pela fiscalização ambiental? Por onde andará a fiscalização ambiental dos órgãos responsáveis pelo município e estado?

Mas querer o que de um estado que concedeu ao governador um prêmio por sua gestão do sistema hídrico, isso durante a maior crise hídrica da história do estado, responsabilidade de um partido há 20 anos no poder e do total descaso dos gestores em recuperar áreas degradadas, preservar as matas ciliares e os mananciais, ou até mesmo gerenciar a crise através de racionamento, mas que foi ignorado. Para que  governador fosse reeleito, ele optou por colapsar o Sistema Cantareira, essa é a forma de se fazer política nesse país.

É triste ver a Nova Alta Paulista definhando e mais triste ainda é constatar a apatia política. Há muito que ser feito, mas como se a região dormisse em berço esplendido a “elite” política se comporta como se não houvesse nada para que, e por quem lutar! Não se iluda com a esquerda dessa região, este estado calamitoso não é exclusividade da direita, a esquerda se não está inerte, está aderida aos tentáculos desse sistema. Ha debates acalorados entre direita e esquerda quando o assunto é o governo do estado e/ou federal, mas há um silêncio ensurdecedor e constrangedor em relação aos problemas das cidades, quer dizer, constrangedor para nós pobres mortais - que ainda nos permitimos sentir vergonha alheia.

No caso de Adamantina, por exemplo, pergunto: quem consegue gerir uma cidade de 33 mil habitantes, tendo como única fonte de receita um orçamento previsto para o município, algo em torno de 80 milhões, incluindo pagamento de pessoal? Este tal “estado de coisas” – penúria financeira - necessita ser administrado por grupos afinados, com projetos e ações interligadas e concatenadas, que prioriza e crie projetos que busquem verbas que não fazem parte do “pacote”, pois meus caros, como 106 milhões dos quais mais de 20 mil foram destinados para a FAI e 54% para pagamento de pessoal, não tem como, não há cristo que dê jeito, precisamos de idéias, de projetos, de planejamento e muito, muito, muito trabalho.

É um tanto quando difícil compreender que em pleno século XXI, carregado de idéias inovadoras, no que tange a gestão pública e privada, ainda se pense e governe uma cidade como há décadas atrás, com uma política voltada para dentro, baseada na antiga e ultrapassada governança provinciana que privilegia grupos em detrimento de uma visão mais ampla de gestão. A moderna administração, baseada em competência administrativa e horizontalização, fundamentada em planejamento e visão em médio e longo prazo, quebra estes paradigmas arcaicos e mostra que é possível conceber e gerenciar uma cidade para todos. A administração do século XXI deve ser pautada no empreendedorismo, na constituição de oportunidades de bons empregos, salários e qualidade de vida.

O brasileiro, desde sempre, não é de se envolver em política, por diversos fatores, mas creio que o mais crucial deles é que, em muitos casos, se sente incapaz de fazer parte de qualquer cena política, pois foi educado, por toda uma vida, a ser comandado e aceitar limites de participação. Mas creio que este estado de coisas vem mudando, o debate contribui e muito para que o cidadão, aos poucos, perca o “medo” e comece a se apropriar da arena pública e, também, a participar da tomada de decisões. Precisamos de gente competente e idéias novas, as demandas mudaram, consequentemente as administrações das cidades do interior, também, precisam mudar, para que os municípios não apenas sobrevivam, mas que ofereçam real qualidade de vida e oportunidades para seus moradores.

Precisamos quebrar este ciclo-vicioso e nefasto que se apoderou da política partidária do interior de São Paulo. Brasileiro não tem memória, este é um triste jargão, infelizmente verdadeiro e que marca de forma indelével uma entre tantas características daqueles que vivem na terra do Pau Brasil. Graças a esta tal “pouca memória”, associada ao pouco envolvimento cultural na política da cidade, grandes erros administrativos são cotidianamente praticadas por aqueles que a comandam, sabedores que ficarão impunes a qualquer delito, pois basta apenas deixar a poeira baixar...

Sobre a autora | Isabel Cristina Gonçalves é Adamantinense, Oceanógrafa, Mestre em Educação e Doutora em Educação Ambiental. Atualmente trabalha como pesquisadora, Pós-Doutoranda, pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) no projeto: "Mudanças climáticas globais e impactos na zona costeira: modelos, indicadores, obras civis e fatores de mitigação/adaptação - REDELITORAL NORTE SP" | Acesse aqui o perfil de Isabel Gonçalves no Facebook

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