A agonizante TV aberta: cada vez mais tecnológica e burra
Em caminhos distintos, a TV se reinventa, na perspectiva da tecnologia, sobretudo com a chegada da TV digital, mas agoniza, sem saber o seu papel, nesse novo tempo.

É cada vez mais difícil se relacionar, positivamente, com a programação da TV aberta no Brasil. Salvo alguns telejornais – que exigem filtros e a interpretação sobre seus enfoques – e outros poucos programas, a maioria do que é levado ao ar é subproduto massificado. É igual papinha pra bebê comprada em mercado: o ruim disfarçado de bom.
Assistir TV é deprimente. É opção para quem não tem outra opção, infelizmente. O mais do mesmo, em versões e variáveis pioradas. Nada é melhor ou menos ruim. A trajetória é de decadência, sobretudo pela oferta de programação artificial, vazia ou apelativa. Ou artificial, vazia e apelativa, tudo junto e misturado.
Para quem não tem opção, assistir TV aberta no Brasil é gastar energia, elétrica e emocional. Por muitas vezes experimentei passar algumas horas diante da TV, e a maioria das experiências é desoladora. Chega a causar arrependimento e desgosto, tanto tempo perdido e sem contribuir em nada. Nem entreter.
A TV agoniza e subestima a capacidade do indivíduo, entre aqueles que conseguem enxergar para além da tela plana. Há um grupo menor, mais atento, que assiste vacinado, a tudo que é ofertado em abundância na sala de casa.
Por outro lado, a TV aberta domestica e alimenta grande camada da população que se submete a isso, se põe como satisfeita, se emociona com o novelismo tipo exportação de heróis e bandidos tupiniquins; julga e massacra assim como tão bem faz o noticiário sensacionalista; e se apodera dos dramas dos mais pobres e miseráveis tão bem explorados pelos programas de auditório, palco de reencontros, reconciliações, casas e vidas instantaneamente transformadas.
O que é desprezível, a semana toda, piora nos sábados e domingos. A TV agoniza, e há décadas não traz novidade. A programação regional é amadora e pouco atrativa, com raras exceções. Programas religiosos, musicais e outros, de baixa penetração no público, servem apenas para garantir receita e faturamento às emissoras, e cumprir com cotas de produções regionais. Mas o público, não tem o que assistir. A programação nacional, em rede, por sua vez, é narcotizante e alienadora.
Mas pode piorar. É quando chega o domingo! Um “mais do mesmo” sem precedentes, na pior cópia da cópia, desgastada, e sem graça e nenhuma novidade. É um dia inteiro “arrastado”, sem alternativas. A programação oferece um humor resquentado que não faz rir, um sensacionalismo previsível, cansativo e apelativo, e programas de auditório “animados” por sílvios, faustões, elianas, gugus, geraldos, portiolis, angélicas, hucks, sabrinas, mions, raús e outros, incapazes de trazer algo novo, que mereça ser assistido.
Não há porta da esperança, reforma no lata velha, nem dança dos famosos ou se vire nos trinta, capazes de reinventar a TV. Nem mesmo uma esquadrilha, com centenas ou milhares de aviõezinhos de dinheiro, motiva ou inspira a busca por algo novo. É tudo muito pobre, vazio e esgotado.
Em caminhos distintos, a TV se reinventa, na perspectiva da tecnologia, sobretudo com a chegada da TV digital, mas agoniza, sem saber o seu papel, nesse novo tempo. E pior que isso, é a massa “midiota”, passiva, enfeitiçada, esperando as cenas do próximo capítulo, que se põe como satisfeita, refém de si mesma, diante da oferta de conteúdo fácil e prático, que não questione ou cause desconforto.
Assistir TV exige manual, sim. É imprescindível filtrar tudo, e perguntar sempre os por quês, na busca de atitudes menos submissas e mais questionadoras. Se pode assistir? Pode sim, mas é preciso saber assistir, e questionar sempre, na busca de uma postura crítica e consciente, confortavelmente instalado no sofá da sala.
Acácio Rocha é jornalista, diretor de conteúdo do Portal Siga Mais.