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Quem tem medo das redes sociais?

No caso de Adamantina, a página do Fecebook do Siga Mais e depois o Portal Siga Mais é um exemplo histórico deste novo cenário onde o cidadão comum, até então mudo e nunca ouvido, ganhou voz e poder de pressão, como nunca antes.

Por: Isabel Gonçalves
Quem tem medo das redes sociais?

O que acontece lá, também acontece cá e acolá, falta em nós à percepção e uma compreensão contextualizada dos fatos. Na realidade, imersos em conceitos e pré-conceitos não nos damos conta que nossa pequena cidade vive as mesmas agruras políticas, guardadas as devidas proporções, do governo federal, pois por aqui mudam os partidos políticos, as ideologias – se é que elas existem – e os agentes públicos, mas no frigir dos ovos, os problemas se assemelham.

O que me aflige neste cenário é que se em micro escala – nossa cidade – a gente não consegue compreender todo o contexto político, atribuir responsabilidades e ser fonte de pressão, o que dirá em escala estadual e federal! Mas podemos aprender muito com este triste cenário que vive nossa cidade, nosso estado e nosso país e tentar, a partir desse estado caótico de desgoverno, dar um basta nesta velha, fisiologista e arcaica prática de fazer política e administrar uma cidade, estado e nação.

O importante é que a gente faça uma reflexão sobre a gestão pública e a inépcia de nossos gestores, assessorados, em assustadora maioria, por pessoas não capacitadas para exercer tal função e também, sobre a inoperância do legislativo, da câmara de vereadores.

Infelizmente a Adamantina está imersa em uma “luta” fratricida entre prós e contrários a uma administração que responde por improbidade. Mas mais do que isso, o que contribui para que este cenário seja ainda mais devastador é a concentração das discussões da comunidade local nesta discussão enquanto problemas estruturais e relevantes para toda a sociedade ficam em segundo plano. O combate a dengue é um exemplo, ano passado a cidade foi devastada por uma epidemia de dengue sem precedentes. Todo o estado também, essa poderia ser a justificativa dos gestores do município, mas o problema é muito mais complexo e pode ilustrar perfeitamente como não entendemos o cerne da questão. O problema da epidemia de dengue é resultante da má gestão do sistema público de saúde em todas as esferas, simples assim, o problema não é apenas o mosquito transmissor, mas sim, nosso sistema de saúde e de gestão de ameaças e riscos que é pouco ou nada inteligente, inerte e inoperante.

O novo grande problema, que bate em nossas portas, é o tal do zika vírus - que é transmitido pelo mesmo mosquito da dengue - que ao picar uma mulher grávida pode levar a uma má formação do feto ocasionando a microcefalia na criança, e, também, pode ocasionar a doença de Guillain Barré em adultos. Tudo isso ilustra o quanto é mal gerido nosso sistema de saúde em todas as esferas – município, estado e federação - e o quanto isso traz imensos prejuízos para nossa sociedade.

Isso, e muito mais, acontece enquanto nossos agentes públicos brigam para se manter no poder. Na realidade a incompetência gestora deveria ser o tópico prioritário de nossas discussões e debates porque ela traz sérios prejuízos para toda a sociedade.

Claro que a corrupção não deve ficar em segundo plano, mas a sua discussão não pode ser a única a pautar o debate e também, não pode ser cortina de fumaça para manobras escusas e indecorosas de políticos que estão mais interessados em poder e, bagunçar, ainda mais, o coreto. Para tanto, a população precisa desenvolver habilidades e competências para fazer uma leitura contextualizada do cenário e que aprenda a separar alhos de bugalhos e consiga atribuir valor e crítica ao que é importante e, não se deixe manobrar por lindos discursos ou criticas “ensaiadas”.

As coisas estão mudando e espero que seja irreversível. Estamos aturdidos com a ganância, corrupção, clientelismo e incapacidade gestora da “elite” política do país, na realidade estamos perplexos com tanto descaso e desfaçatez, mas ao mesmo tempo, por outro lado, o que poderia ser puro desalento fez eclodir em nós uma insatisfação monstruosa e um desejo incontrolável de mudar a cena política.

Não sabíamos como e nem por onde nos mover para atacar todos estes problemas, a impotência era um sentimento que dominava a todos nós e para complicar todo este cenário, até bem pouco tempo, a única informação que chegava até a nossa sociedade era desconectada da realidade, massificada, manipulada e servil a quem pagava ou detinha o poder, informação que era restrita a grupos de poder que controlavam a pauta da mídia.

Mas hoje esta mídia, graças às redes sociais, foi desmascarada e também suas formas explicitas – mas muito bem mascaradas – de contar um caso que vinha ao encontro da pauta do “poder do dia”. Reportagens investigativas passaram a ser raras em muitos veículos de mídia, coincidentemente patrocinados por ricas e polpudas cotas de propaganda oriunda de dinheiro público. Infelizmente notícias veiculadas mais pareciam um relato escrito por assessores de imprensa do que por jornalismo crítico.

Pois é meus caros, aquela gente cansada que chegava do serviço e engolia sem pensar a informação do dia, hoje abre um site da internet e recebe outro tipo de informação, na realidade poderia dizer que recebe a “contra informação” do que havia visto, e isto está chacoalhando a vida dos agentes públicos até então acostumados a mandar, desmandar  e controlar a informação. E tem mais, se este trabalhador não utiliza as redes sociais, ele certamente conversará com alguém que não apenas leu, como também, discutiu as notícias do dia em algum ambiente virtual.

Este novo veículo de “encontro”, debates e compartilhamento de ideias chegou para quebrar os elos mentirosos que unem as algemas que nos prendem a manipulação explícita e, também, desconstruir “verdades”. As redes sociais são rizomas que se espalham, ligam e nos une. Une pessoas e culturas que jamais se encontrariam em um mundo físico, devido a todas as barreiras geográficas. Une também amigos próximos e distantes. Mas acima de tudo, une ideias, induz ao diálogo, promove discussões, produz conhecimento e saber.

Por este motivo é um tanto quanto incompreensível que alguns digam, saiam do ambiente virtual e façam alguma coisa. Dialogo, debates, descontração de “verdades” e compartilhamento de ideias que acontecem em ambientes virtuais de discussão são tão reais como os que ocorrem no ambiente de trabalho, nas esquinas, nos almoços de família... Estejam seguros de que muito do que vemos hoje movimentar, estremecer e fazer balançar o cenário político, não apenas de Adamantina, como também, do estado e federação estão diretamente associados a este novo campo de debate, e lembrem-se, por trás de cada computador tem um eleitor e também um formador de opinião e muita, muita pressão social, haja visto que muito do que aconteceu em Adamantina nos últimos anos tem muito a ver com a forma de desconstrução e pressão exercida pela população que utilizaram como amplificador e caixa de ressonância as tais redes sociais. No caso de Adamantina, a página do Fecebook do Siga Mais e depois o Portal Siga Mais é um exemplo histórico deste novo cenário onde o cidadão comum, até então mudo e nunca ouvido, ganhou voz e poder de pressão, como nunca antes.

O que precisa ser entendido é que o nosso papel, diante dessa conjuntura, é o de lutar para que os indivíduos tenham voz, que sejam sujeitos de sua história e possam livremente expressar seus desejos, saberes, suas vontades, quebrando o ciclo-vicioso da "única verdade", abrindo novos espaços de diálogo e de veiculação de informação livre de "amarras".

Neste cenário os campos organizacionais necessitam ser preenchidos com engajamento e ativismo por cidadãos autônomos e livres, onde o respeito à “autonomia e à dignidade de cada um é um imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceder uns aos outros”.

Sobre a autora | Isabel Cristina Gonçalves é Adamantinense, Oceanógrafa, Mestre em Educação e Doutora em Educação Ambiental. Atualmente trabalha como pesquisadora, Pós-Doutoranda, pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) no projeto: "Mudanças climáticas globais e impactos na zona costeira: modelos, indicadores, obras civis e fatores de mitigação/adaptação - REDELITORAL NORTE SP" | Acesse aqui o perfil de Isabel Gonçalves no Facebook.
 

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