Saúde

Com dívida de R$ 30 milhões, Clínica de Repouso pede socorro

Juíza faz duras críticas à diretoria e convoca sociedade para se mobilizar pelo não fechamento.

Por: Da Redação atualizado: 3 de fevereiro de 2017 | 12h17
Há cerca de um ano e meio, a atuação da Clínica é alvo de uma apuração detalhada, realizada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (Foto: Siga Mais). Há cerca de um ano e meio, a atuação da Clínica é alvo de uma apuração detalhada, realizada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (Foto: Siga Mais).

A dívida total da Clínica de Repouso Nosso Lar, de Adamantina, está em torno de R$ 30 milhões. Os números preliminares foram citados nesta sexta-feira (20), em uma reunião convocada no início da tarde pela juíza de direito da 3ª Vara da Comarca de Adamantina, Ruth Duarte Menegatti. O encontro aconteceu a partir das 16h, no plenário do Tribunal do Júri, no Fórum de Adamantina.
Participaram da reunião o presidente da Câmara, Eduardo Fiorillo, e os vereadores Acácio Rocha, Dinha Santos Gil, Edinho Ruete, Hélio José dos Santos, João Davoli e Paulo Cervelheira, além de duas representantes da Clínica de Repouso, e o prefeito Márcio Cardim, acompanhado de representantes das secretarias de Saúde e Jurídico que, antes, participavam de uma reunião, com pauta semelhante, junto ao Ministério Público.  Os vereadores Alcio Ikeda e Aguinaldo Galvão não participaram por estarem em viagem.
No encontro, a juíza fez duras críticas, objetivas, à gestão do hospital, que atualmente atende 143 pacientes (atualizado até 17/01), entre dependentes químicos, psicóticos e residentes, de vários municípios da região, e à eventual omissão da instituição em não ter buscado alternativas, como o perdão total ou parcial das dívidas previdenciárias e tributárias, entre outras, junto ao governo federal.
Na sua fala, ela destacou que há caminhos para buscar o perdão da dívida e citou casos semelhantes, em que instituições do mesmo perfil, e com o mesmo problema, conseguiram o benefício. O temor da juíza é que a ausência dos gestores e a vertente que sinaliza pelo fechamento podem trazer reflexos de grande impacto, de dimensões financeira e social.
No campo financeiro, o fechamento da Clínica de Repouso pode impactar em novas despesas ao poder público municipal, diante de eventuais decisões judiciais que pedirão a internação de pacientes, que deverão ser cumpridas, e o poder público municipal ficará obrigado a custeá-los, junto à rede privada, inclusive em outras localidades, como já adiantou a própria juíza.
Já considerando os aspectos sociais, o encerramento desses serviços traz prejuízos à saúde desses pacientes, transtornos aos familiares e outros fatores que o distanciamento pode repercutir na recuperação dos mesmos.
Há cerca de um ano e meio, a atuação da Clínica é alvo de uma apuração detalhada, realizada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, representado pela Promotoria de Justiça da Comarca de Adamantina.

Sem convênio desde 1º de janeiro

O drama vivido pelo hospital, e nele se inserem seus 144 pacientes e 104 funcionários, é o encerramento do convênio celebrado entre o Município de Adamantina e o SUS, para recebimento de recursos e seu repasse automático à Clínica de Repouso, e que representa cerca de R$ 220 mil ao mês, aplicados no custeio interno, como alimentação, salários e outras despesas.
O convênio não foi assinado pela atual administração municipal sobretudo diante do risco de uma eventual responsabilização do prefeito por improbidade administrativa. O hospital está sob investigação, a partir de um inquérito civil aberto pelo Ministério Público, que apura supostas irregularidades na gestão hospitalar.
E por estar devendo tributos (encargos trabalhistas, previdenciários e outros, à União), a Clínica de Repouso não tem a CND (Certidão negativa de Débito), ficando impedida, assim de receber diretamente os repasses do SUS. O caminho, então, se deu por vias municipais, onde desde 1º de janeiro de 2014 o Município recebe o recurso e faz o repasse. Sem a CND, o município também não poderia fazê-lo, sendo que a atual administração municipal decidiu pela cautela e não assinou o convênio para este ano.
Sem o convênio desde 1º de janeiro, o horizonte é de incerteza. Um dos caminhos, citados na reunião desta sexta-feira pelo prefeito Márcio Cardim, é que a transferência financeira se faça por determinação judicial, mediante intervenção judicial determinada pela Justiça, o que garantiria a sobrevivência da Clínica, combinada a um plano de trabalho que culmine pelo seu fechamento.
Mesmo sem a CND, a Clínica mantém seu Certificado de entidade beneficente de assistência social com atuação na área da saúde, e pode usar desse facilitador para buscar o perdão da dívida junto à União. O Certificado foi renovado pela Secretaria de Atenção à Saúde, do Ministério da Saúde, pela Portaria Nº 1.680, de 23  de novembro de 2016, publicada no Diário Oficial da União de 25 de novembro subsequente (Seção 1, página 38).

Caminhos: fechamento ou manutenção dos serviços?

A reunião a juíza deixou claro o objetivo de sensibilizar as autoridades locais e somar forças, no desafio de buscar meios que garantam a prestação desses serviços à comunidade local, seja pela Clínica de Repouso atuando dentro de uma nova configuração e nova diretoria, ou seja até mesmo pela instalação de uma nova instituição.  O fechamento do hospital e o fim dos seus serviços, à comunidade, trariam sérios transtornos.
Uma das alternativas apresentadas sugere o estabelecimento de um cronograma, que caminhe pelo fechamento da Clínica e a distribuição dos seus serviços junto a outros órgãos, criando uma rede local, que passa pela sobretudo pela instalação das residências terapêuticas e fortalecimento das ações do CAPS (Centro de Atenção Psicossocial), enquanto os dependentes de álcool e drogas seriam encaminhados a instituições terapêuticas que lidam com esse público.
A grande incógnita envolve aqueles em que a internação psiquiátrica é imprescindível, que por um lado poderiam ser atendidos pela Santa Casa local, criando uma ala específica, ou na contratação desses serviços junto à rede privada, de outras localidades, o que, certamente, implicaria em custos ainda maiores, sem contar os aspectos do distanciamento familiar, que impactariam no tratamento e recuperação de pacientes com esse perfil.
Ainda na busca de sensibilização, a juíza aposta na mobilização da cidade, como um todo, para garantir a manutenção desses serviços, dentro de uma nova proposta, centrada em uma nova administração da Clínica. E para isso, espera a adesão da população, da sociedade organizada, dos clubes de serviços e das demais instituições, inclusive religiosas.
Outra sinalização levantada na reunião é a sugestão pela contratação de uma equipe especializada nesses serviços, que permita a recuperação institucional, apure efetivamente o cenário e indique caminhos.

Câmara propõe comissão

Em sua fala, o vereador Hélio José dos Santos sugeriu a criação de uma comissão para se aprofundar nos estudos e buscar, conjuntamente, alternativas ao cenário de crise vivido pela Clínica e os serviços em psiquiatria prestados à região.
Ao final, já houve um consenso entre os vereadores presentes, que visitarão instituições na região, que passaram por crises semelhantes e conseguiram superar suas maiores dificuldades. Foram sugeridas três instituições, localizadas em Andradina, Presidente Prudente e Bilac. As visitas técnicas dos vereadores, a essas instituições, deve ocorrer já na próxima semana.

Reunião realizada na tarde desta sexta-feira, no Fórum de Adamantina, presidida pela juíza Ruth Duarte Menegatti (Foto: João Vinícius).

Críticas à atuação da diretoria da Clínica

A juíza  Ruth Duarte Menegatti defende a possibilidade de afastar a atual diretoria, como disse abertamente, na reunião. Ao final, ela atendeu a imprensa, abordando inicialmente sobre os objetivos do encontro. “Viemos pedir ajuda dos vereadores para que a gente promova sim uma intervenção, mas de forma humana e buscando avaliar a necessidade efetiva do fechamento integral ou uma readequação do local, e que juntos possamos avaliar qual seria a melhor alternativa para a Clínica. Logicamente, nos moldes como está, não pode ser mais mantida”, disse.
Ela defende caminhos que não levem ao fechamento da Clínica e o encerramento dos seus serviços à comunidade local. “A readequação do modelo é necessária, já está acontecendo, buscando evitar-se a internação. Mas em muitos casos, a internação ainda é necessária”, completou. “O pedido é para que a comunidade nos ajude a apoiar este local, para que ele termine ou reinicie com outra administração e outros moldes” continuou.
Em sua fala, ela reforçou, reiteradamente, a necessidade de sensibilizar a sociedade e buscar parcerias, para que a comunidade  continue a ter atendimento médico psiquiátrico necessário, remodelado evidentemente, mas não encerrado. “É um serviço que nós prestamos àqueles que não falam. Todos podem ser representados, eles não. E nós colocamos essas pessoas, muitas vezes, relegadas na sociedade”, disse.
Sobre o inquérito civil que tramita no Ministério Público, a juíza explicou que aguarda uma análise por parte do promotor, que solicitou várias auditorias para levantar a real situação da instituição. “Evidentemente é grave”, definiu. “Sem uma análise é impossível dizer se é possível manter ou não. Estamos buscando há tempos um anova diretoria. O que não pode é encerrar-se de qualquer jeito, sem uma avaliação criteriosa, sem um encaminhamento adequado”, ponderou.
Ao final da entrevista à imprensa, a juíza justificou a atuação, neste  caso, explicando que a Clínica de Repouso é uma instituição privada que se utiliza de recursos públicos para prestação de seus serviços. Ela lidera um movimento junto à sociedade civil e instituições locais e regionais, para apoio material e afetivo aos pacientes da Clínica. “Até começarmos o movimento, a Clínica era desconhecida, talvez até de forma intencional.  Parece que a diretoria gostava que não fosse efetivamente conhecida toda a situação do local”, completou.

“Raio X” da Clínica de Repouso

Dívida: em torno de R$ 30 milhões, sobretudo trabalhistas, encargos tributários, previdenciários e outras, que se acumulam desde a abertura da instituição, em agosto de 1980. São 36 anos sem recolhimento desses encargos.
Funcionários: 106 funcionários distribuídos em 3 alas (enfermarias), médicos, equipe técnica, enfermagem, administração, cozinha, lavanderia, terapia ocupacional, manutenção, farmácia e limpeza.
Leitos: São 144 leitos conveniados, dos quais 96 são masculinos e 48 femininos. Desses, 97 são ocupados por pacientes residentes e aqueles que estão internados por determinação judicial, e 47 entram na rotatividade. São 143 pacientes internados (atualizado em 17/01), dos quais 44 são dependentes químicos, 57 psicóticos e 42 residentes.

Clínica tem 144 leitos, 106 funcionários e acumula dívida desde 1989, quando iniciou suas atividades (Foto: Siga Mais).

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