O dia que o trem parou
Leia texto de João Passarinho para o livro Antologia – 1ª Antologia de contos, poemas e crônicas regionais.
Eu nasci e fui criado
À margem da ferrovia
Da companhia Paulista,
Na colônia que havia.
Trem chegando, trem partindo
E a gente só assistindo.
Adamantina crescia.
O meu pai, ferroviário
Trabalhava no armazém
Conferindo os produtos
Transportados pelo trem.
E nos pedia cuidado
Pra não fazer o errado,
Mas criança vai além
O meu maior desejo
Era ver o trem parar
Defronte da minha casa.
Ficava a imaginar
Grande movimentação,
Como se fosse a estação.
Minha vida era sonhar
Como nada acontecia
Eu tomei a decisão
De forçar o trem parar,
Pois seria a solução.
Já cansado de esperar
Pro meu sonho realizar
Entrei logo em ação.
Eu já tinha um dez anos,
Fabriquei um lampião.
Usei lata, arame, vela
E papel vermelho, então.
Comecei me preparar
Pra fazer o trem parar
Muito antes da estação.
E naquela mesma noite,
Lampião já fabricado,
Fiquei defronte de casa
Aguardando preocupado,
Pois estava decidido
Fazer tudo escondido
Pra não ser testemunhado.
Do trem o som do apito
Mostrou que era o momento.
Acendi meu lampião
Pra praticar meu intento.
Fui então perto da linha
E vi o trem que lá vinha.
Começava o meu tormento.
Levantei a luz vermelha,
Comecei a sinalizar.
De repente a brecada.
Ouvi o trem se arrastar.
Senti um grande pavor,
Foi um momento de horror,
Dali busquei escapar
Saindo em disparada
Logo entrei num matagal
Apagando o lampião
Numa escuridão total.
O lampião foi jogado
O trem estava parado
E eu senti que fiz um mal.
Correndo longa distância
Uma grande volta eu dei.
Pelos fundos lá de casa,
Abri o portão e entrei.
Sem querer ser descoberto,
Não vendo ninguém por perto,
Fui pro meu quarto e deitei.
Bastante arrependido,
Permaneci lá quietinho.
Nem conseguia dormir
Pensando ali sozinho:
Se dessa eu escapar
Juro que vou me emendar.
E rezava bem baixinho.
Meses, anos se passaram
E eu morrendo de medo.
A minha vida tranquila
Transformou-se num degredo.
Um menino amedrontado,
Dia e noite assustado,
Que guardava um segredo.
E durante muito tempo
O medo me atormentou
Mas o fato ocorrido
Jamais alguém comentou.
Aquilo foi encerrado,
Mas pra mim ficou marcado [1]
O texto integra o livro: Antologia – 1ª Antologia de contos, poemas e crônicas regionais, lançado no último dia 26/11/2019 em Adamantina.
João Passarinho
Funcionário Público Municipal
Escritor, Cordelista e Contador de histórias
Tiago Rafael dos Santos Alves
Professor, Historiador e Gestor Ambiental
Membro Correspondente da ACL e da AMLJF
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[1] PASSARINHO, João. O dia que o trem parou. In: GIL, Izabel Castanha, OLIVEIRA, José Braz de. (Org.) Antologia – 1ª Antologia de contos, poemas e crônicas regionais – 1ª Ed. Adamantina/Osvaldo Cruz, SP: Impress, 2019. p. 32-33.