Tecnologia

O fim do Flash

A partir de 31 de dezembro, a Adobe interromperá a distribuição e atualização do aplicativo Flash.

Carlos Schults | carlos@carlosschults.net Colunista
Carlos Schults | carlos@carlosschults.net
O fim do Flash

Notícias recentes: o Flash está morto. Respirem aliviados, fãs da DC Comics: não estou me referindo ao homem mais rápido do mundo. O Flash a que me refiro é o software usado para criar animações e vídeos em páginas Web e que foi imensamente popular desde o fim dos anos 90 até meados da década seguinte.

A Adobe, empresa dona do Flash Player, publicou ontem uma página divulgando informações a respeito da aplicação. Segundo a empresa, 31 de dezembro de 2020 será a data EOL (end-of-life, ou “fim de vida”, em tradução livre) para o Flash. A partir desta data, a Adobe interromperá a distribuição e atualização do aplicativo.

O que é o Flash?

O Adobe Flash é uma plataforma de software multimídia usada para criar animações, vídeos, jogos, entre outras finalidades. O Flash também possibilitava capturar a interação do usuário, através do mouse, teclado, e até mesmo câmera e microfone.

De forma simplificada, o Flash é composto de duas partes: o software que permite aos desenvolvedores criar conteúdos, e o Flash Player, que é um plugin instalado nos navegadores dos usuários, permitindo que eles consumam conteúdo em Flash.

Aplicações do Flash

O Flash foi imensamente popular quando a Web era mais jovem. Os navegadores não possuíam capacidade de lidar com animações ou vídeos, e o Flash preenchia essa lacuna.

Vejamos alguns exemplos.

Charges.com.br

Uma das minhas primeiras memórias da internet é acessar o site charges.com.br, quando fazia curso de informática na Microlins em 2002. O site, criação do chargista e cartunista Maurício Ricardo, foi um dos pioneiros do humor na Web, e se tornou imensamente popular na década de 2000, tendo suas charges exibidas inclusive na Rede Globo.

Mundo Canibal

Outro clássico dos primórdios da internet brasileira, o site Mundo Canibal foi criado em 1995 e sobreviveu até 2014. O site produzia e publicava animações de humor, dentre as quais a mais famosa é provavelmente a infame “Avaiana de Pau.”

Com a criação e popularização do YouTube, foi questão de tempo até que o site migrasse para a plataforma de vídeos. O sucesso do Mundo Canibal se expandiu para outras mídias, como TV, quadrinhos e até games.

YouTube

O próprio YouTube usava Flash em seus primórdios. Desde sua fundação, em 2005, até o ano relativamente recente de 2015, o site de vídeos usava o Adobe Flash como o meio default para a reprodução de vídeos.

Mas o que o YouTube e outros sites atualmente usam no lugar do Flash? E por que pararam de usar o Flash, para começo de conversa?

Por que o flash caiu em desuso?

É importante frisar que o encerramento oficial do Flash no último dia deste ano é pouco mais que mera formalidade. A plataforma já não é mais usada em larga escala já há um bom tempo. Todos os principais navegadores bloqueiam por padrão a execução do Flash e muitos dos sites que utilizavam essa tecnologia migraram para alternativas.

Mas por que abandonar uma tecnologia responsável por criar sites tão divertidos? Os motivos principais são três: preocupações com segurança, falta de acessibilidade, e o surgimento de concorrência na forma de formatos abertos.

Segurança

Ao longo dos anos, muitas vulnerabilidades de segurança do Flash foram exploradas, permitindo a instalação de programas maliciosos, exibição de adwares, e até mesmo roubo de dados dos computadores dos usuários.

Acessibilidade

Pessoas cegas ou que têm baixa visão acessam a Web através de programas chamados leitores de tela. Tais programas leem o conteúdo das páginas Web e o reproduzem com uma voz automatizada, de modo que os usuários cegos possam acessar e usar esse conteúdo.

Sites feitos totalmente em Flash (comuns no passado) eram um desafio sério para esses programas, que não tinham nenhum texto para conseguir ler e reproduzir. Embora a Adobe tenha feito alterações no Flash para garantir uma melhor acessibilidade, outras tecnologias melhoras já tinham se tornado mais populares.

Formato Proprietário

Páginas web são criadas principalmente com três tecnologias: HTML, CSS e JavaScript.  Essas tecnologias são abertas, o que significa que nenhuma empresa é dona delas e o seu uso é aberto a todas as pessoas. Desenvolvedores não precisam pagar licenças ou royalties para criarem sites usando HTML/CSS/JavaScript.

O Flash, ao contrário, é uma tecnologia fechada, de propriedade da Adobe. Apenas uma empresa controlando um aspecto enorme da Web não é saudável. É por isso que, nos últimos anos, empresas passaram a adotar o HTML5 no lugar do Flash.

O HTML5 é uma tecnologia aberta e acessível que oferece capacidades de animação e exibição de vídeos que antes só estavam disponíveis com o uso do Flash. Todos os navegadores modernos suportam HTML5 nativamente, sem a necessidade de instalação de nenhuma ferramenta de terceiros.

O que acontece com os sites antigos que usavam Flash?

Se após 31 de dezembro o Flash vai parar de funcionar definitivamente, o que isso significa para os sites que usam/usavam Flash?

Resumidamente, eles não serão mais acessíveis. Os sites que ainda estão no ar serão provavelmente desativados; não faz sentido gastar dinheiro mantendo sites com conteúdos impossíveis de serem consumidos.

Isso representa um problema sério para a memória da Web. Com o fim do Flash, uma boa porção dos sites dos primórdios da Web pode desaparecer sem chance de recuperação. Existem grupos e indivíduos tentando evitar que isso aconteça, como o arquivista BlueMaxima, cujo projeto Flashpoint pretende arquivar o maior número possível de games em Flash.

Desenvolvedores também estão se organizando para realizar uma petição para que Adobe libere o código do Flash em modo open-source (código aberto), para que terceiros possam desenvolver versões seguras da plataforma a fim de arquivar o conteúdo da Web primordial.

Conclusão

A substituição do Flash por tecnologias modernas, acessíveis, seguras e abertas é um passo positivo na evolução da Web. Porém, corremos o risco de enterrar uma parte inestimável do passado da Web no processo. Eu, particularmente, apoio os esforços de arquivamento.

Como o fim do Flash vai afetar você? Provavelmente, em nada. O seu navegador provavelmente já bloqueia a tecnologia por padrão. Caso precise, é possível reativá-la para usos pontuais, mas só até 31 de dezembro. Depois disso, o que sobra é nostalgia e saudade.

Carlos Shcults. Consultor em tecnologia da informação, desenvolvedor e autor técnico. E-mail: carlos.schults@gmail.com.

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